terça-feira, 27 de outubro de 2009

Quinha.


Para dr, Roberto, uma tia avó.
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Quinha

Quinha.
Francisca, Francisquinha: Quinha sempre foi muito velhinha. Carregava sempre guarda chuva e maleta contendo papeis importantes: carteira de aposentada e retratos das netas, todas muito bonitas.

Mona Lisa e Seu Retrato 2


Mona Lisa e Seu Retrato 2
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You here?


You here?
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Monalisa, Monalisa, o que fizeram com você?
__Bandejas, canecas, toalhas de plástico, guardanapos descartáveis, latas de lixo, músicas bregas, filmes ruins e muito mais.
Você é, sem que nunca o tenha vislumbrado, a mais serena e a mais intangível das popstars.
Ao tentar copiá-la, mesmo que parodiando, aí que se percebe ainda mais profundamente o quanto você é irreproduzível, mas mesmo assim a gente tenta, pois a perfeição é muito sedutora, ainda mais quando sorri.

Galeria de retratos.

Maria Maria minha mãe Anaïs.


Maria Maria minha mãe Anaïs.
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Nanna


Nanna
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Kico.


Kico.
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Wino


Wino
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Bia na Bahia .


Bia na Bahia .
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Gláucia Batista.


Gláucia Batista.
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Joãozinho.


Joãozinho.
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Lívia 1


Lívia 1
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Juliana.


Sem título
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Bia.


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Paula Katarina


Paula Katarina
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Raphael.


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Chico.


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Eu.


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Jairinho.


Jairinho ainda não sabe se gosta
ou não
de macarrão

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Ricardo.


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Alê.


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Clarice.


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domingo, 25 de outubro de 2009


Almoço.

O primeiro almoço do ano foi patético. A comida ruim foi pretexto para outras sugestões de receitas, temperos que deveriam ter sido usados, técnicas de tias e mães para cozidos, farofas e a maneira correta de aquecer o arroz, além da pimenta que, ao contrário do que se diz, não provoca nem agrava as hemoróidas. Só a pimenta do reino, tia, quando usada em grande quantidade.
Muito cuidado com os ossos de frango, não deixem os cachorros pegarem e embrulhem bem o lixo. Até os cachorros de raça são vira latas, hahaha, sabia disto, tia? Os ossos de frango viram agulhinhas e perfuram o intestino dos cães, provocam hemorragias internas, o bicho morre evacuando sangue.
__Você falou “evacuando”, Lu?
__Claro. Queria que eu falasse palavra chula durante a refeição? compostura é muito importante, num é mesmo tia?
__É, claro que é.

sábado, 24 de outubro de 2009



Paracelso.
15 de agosto de 2009-08-15 (Celso).
Jairinho me ligou chorando muito, foi difícil entender sua voz rouca interrompida pelos soluços. Ele dizia: “faleceu, faleceu hoje, faleceu”.
Quem, Jairinho, quem faleceu? Vinícius, Tom, Michael Jackson? Foi sempre você quem me informou desses falecimentos que o deixaram tão triste e exaltado, quase festivo em seu descontrole de doido quase santo. Quase? Sei não, penso às vezes que Jairinho é santo mesmo, ninguém tem os olhos assim tão transparentes em vão. Aqueles são olhos de santo, ou anjo, caso exista anjo.
_O Celso! Foi o Celso quem faleceu. Acordou, tomou banho, tomou café e faleceu.
Celso era lindo. Também tinha os olhos azuis e transparentes feito os do irmão. Mas não olhos de santo, eram olhos bonitos de gente mesmo. Foi também magrinho, cabeludo e apaixonado por uma inglesa chamada Kath que casou com ele, veio para o Brasil, não gostou, até do marido se desencantou e voltou para a Inglaterra de onde não mais saiu. Soube-se que casou de novo e tem dois filhos.
E o Celso? Continuou apaixonado, sonhava voltar à Europa para arranjar outra inglesinha, e hoje de manhã tomou banho, tomou café e faleceu.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Texto de meu amigo Paulo Augusto de Lima.


Quando eu era menino...
As coisas pareciam mais fortes
Porque eu era menino;
A pimenta, o azeite, o alho pareciam mais fortes;
O quarto parecia maior,
Os horrores pareciam maiores; O leite era o leite.
Quando eu era menino, as calças sim, eram mais curtas,
O sapato vulcabrás,
E eram tantos fardins;
Só depois descobri as matas;
Só via a miséria, às vezes;
Hoje conheço sua face cruel.

Quando eu era menino,era só ir à escola.
Hoje estou formado pela escola da vida.
Deus era só uma idéia;
Hoje, mais perto de Deus.
Mal conhecia o mau;
Hoje o coheço bem.
As mulheres eram meninas,
As mulheres eram mistério.

Também me apaixonei pela
Professora.
Tive um coelho;
Tive um cão;
Tive um passarinho.
Tinha meu avô.
Quando eu era menino.
Oh, que saudades
Que eu tenho.

sábado, 10 de outubro de 2009

Coisas tantas e fascinantes.


Selma Weissmann














Coisas tantas e fascinantes















2007









Ondina, dona Ondina.
A menina, curiosa e dissimulada, ao ouvir o nome Ondina, imaginava seios fartos em luxuoso decote de veludo preto, oscilando feito ondas, em dia de maré calma.


















A mãe e as tias sussurravam quando falavam de Ondina, cuidavam que as crianças não ouvissem, aumentando ainda mais a curiosidade da menina astuta, que fingia se ocupar de qualquer coisa menos suspeita do que o intrigante mistério de Ondina.
Entreouvia palavras magníficas: divórcio, petulância, roupas raras feitas por modistas, leques de plumas, coisas tantas e tão fascinantes que, quando tinha febre, a menininha delirava, imaginando o mundo suspeito e atraente de Ondina, em ondas, quebrando suaves no decote macio.











E a beleza? Ao falarem da beleza de dona Ondina, a mãe e as tias, que ainda eram bonitas, pareciam se recolher à senzala das mulheres feias. Negros cabelos de azeviche, carnudos lábios obscenos de batom vermelho, olhos escuros e pintados de (aí a menina ouviu a palavra mais bonita) : “prostituta”.














Enquanto as mulheres conversam e bordam na varanda, Menina , às escondidas, consulta o dicionário do avô. A resposta não esclarece nem agrada : “mulher de vida fácil, meretriz”. Decepcionada, volta ao alpendre e ouve uma das tias: “à luz do sol, que Deus me perdoe, mas é um descaramento”. Outra tia, esta muito míope : ”foi ela, sim, que acabou de passar, estou sentindo o perfume indecente! “A mãe: ”é uma pena, mulher tão bonita.”











Ao perceber que havia perdido talvez a única oportunidade de ver de perto dona Ondina, a prostituta que acabara de passar diante da casa dos avós, a menina deu meia volta e correu. Passou pela sala de visitas, pela sala de jantar, pelo corredor dos quartos, pela despensa, banheiro e cozinha. Ofegante, desceu a escada que levava ao tanque de lavar roupas, atravessou o longo quintal e chegou ao portão dos fundos, na garagem onde ficava o Chevrolet preto.












Deitou no chão e, pelo estreito espaço abaixo do portão, ainda teve tempo de ver os pés branquíssimos, calçados em estupendos sapatos de saltos muito altos e finos, listrados de preto e branco: listrinhas bem finas, discretas, a coisa mais inusitada que já vira.












Continuou deitada no chão até parar de ouvir o toc-toc dos passos de Ondina. Respirou fundo várias vezes, apreciando o ar puro da tarde verde e resolveu: ”quando crescer, só vou usar sapatos bonitos assim, de meretriz”.

Minha filha disse.

Minha filha disse.

Minha filha disse: _Acho que vovó roubou a idéia de Guimarães Rosa quando escreveu o conto do jardim, parece demais.
Não roubou não, meu bem, sua avó não roubaria nem dinheiro, quanto mais um jardim. Acontece que naquela época toda criança, principalmente as muito sós, tinham jardim com insetos, passarinhos e gato. Até eu, que vim depois, fiz guirlandas de miositis e me escondi no meio da cerca viva para esperar o pulo do gato em cima do rato.
Minha tia perdeu a aliança no jardim e nunca mais a achou, por mais que cavucássemos a grama e a terra dos canteiros. A busca durou semanas e o assunto meses, foi uma de minhas mais emocionantes aventuras, mesmo que em vão.
A aliança da Tia deve estar debaixo do prédio que construíram no lote onde havia o jardim. Prédio grande e feio com jardinzinho raso onde não se pode nem perder uma jóia para sempre.

Laços e lenços.

Laços e lenços.

Arrumados em uma velha caixa de lenços” Paramounte”, você deixou para mim uma flor seca e um monte de lápis-de-cor da sua infância. Alguns muito gastos, toquinhos pequenos, outros quase inteiros, cores que não deviam lhe agradar, vermelho sangue, por exemplo, você nem usou.
Amarelo e azul celeste, você quase acabou com eles. Parece até que só guardou os caquinhos para que me servissem de guia na viagem para trás em busca de sua infância da qual, sem que soubéssemos, eu já fazia parte.
Alguns lápis têm na parte superior um chanfro vigoroso, feito à faca de cozinha, onde sua mãe escreveu “Ricardo”.
Guardiã dessa estória triste , cheia de afetos e cuidados, contida na antiga caixa de lenços, eu me pergunto o que houve com Ricardo Menino que gostava tanto de azul e amarelo , nunca vermelho sangue? Oque houve com Ricardo Menino que deixou para mim todos os lápis-de-cor que o menino Ricardo não acabou de usar?
Cadê o menino, cadê a menina? Ela vai enxugar lágrimas com lenços que não são mais de pano, lágrimas e lenços descartáveis? Ou , com muito cuidado para não quebrar as pontas, em registros coloridos, ela tenta redesenhar a vida e viajar pra frente?

Amigos.

Amigos.( Um caso comum).

Fomos amigos por muitos anos. A presença dele me trazia alegria e a minha, por algum motivo vago, fazia com que ele se sentisse importante. Tínhamos dias certos para nossos encontros. A felicidade com hora marcada. Os risos, as pantomimas, às vezes lágrimas rasas, saudades da adolescência e da infância que, não sabíamos então, ainda estavam muito perto de nós.
Um belo dia, ou noite, uma terceira pessoa apareceu. Outras já haviam surgido e em nada interferiram em nossa amizade, eram coadjuvantes ou espectadores de nosso perfeito entrosamento.
O terceiro, aquele a quem Tereza deu a mão, chegou para criar uma cisão entre nós. Aos poucos, nossa amizade tornou-se nublada, carregada de olhares suspeitos e palavras dúbias. Nossos encontros se espaçaram, meu amigo adquiriu hábitos incompatíveis com os meus, até que parou de me procurar.
Não sofri com a ausência, tive até certo alívio em deixar para trás todas as lembranças que de repente já não me eram mais atraentes.
Eu o encontrei algumas vezes casualmente e fomos educados e cordiais como devem ser conhecidos antigos e distantes. A última vez que o vi, percebi que seu bonito rosto estava marcado e triste. Pareceu-me alguém sem importância.
O Terceiro? Não sei por onde anda, é provável que tenha se mudado daqui.
23 de janeiro de 2009.

Kaká e Bete.

Kaká é Carmem.
Baixinha, olhos enormes e grandes perspectivas : quer comprar uma casa pequena num terreno bem grande, plantar muito, criar bichos, inclusive rãs, viver “em comunhão com a natureza”. Isto, quando ela tiver dinheiro, Kaká me conta enquanto separa mudinhas de suculentas dentro do saco plástico . Ecológica, ela vai plantar nas jardineiras das minhas velhas janelas, tão bonitas quanto preciosas e desgastadas.
Eu a observo, simulo atenção enquanto penso em Bete.
Bete, Lizabeth, teve quase tudo : muitos homens, algumas talvez mulheres,uma casa grande onde ela passava mais tempo no porão onde, ninguém sabia o porquê, ficava um piano de meia cauda que Bete tocava alegre e cantava alto. Voz fininha, vaudeville alemão. Alegre, sempre muito alegre, morreu de repente sem nunca haver percebido que era triste.
Volto à Kaká. Carinhosa com plantinhas e pessoas, explica a diferença entre a boa terra e os substratos, enquanto brinca com a minhoca marron e úmida que faz nervosas volutas entre seus dedos delicados.

Ela.

20 de agosto de 2009.

Ao perceber que ela está chegando, feche bem a janela e os botões da blusa. Ligue a televisão e faça esforço para se concentrar no que estiver passando, mesmo e principalmente se for algum esporte coletivo.
Você pode se sentar em uma cadeira dura, manter a coluna ereta e não desviar os olhos do monitor. Se houver um cachorro, ele vai deitar ao seu lado e será de grande ajuda caso haja qualquer ameaça.

18 de agosto de 2009. (Lembranças).
(perdão pelo “arquivo empoeirado da memória”, foi irresistível).

Estas unhas onduladas nas pontas de meus dedos não são as minhas. Aliás,nem os dedos são meus, pertencem a outra pessoa que conheci e não consigo localizar no arquivo empoeirado da memória.
Mas as unhas, estas eu conheço muito bem. São as unhas de minha mãe que me encantavam enquanto ela tricotava longas echarpes para Isadora Duncan. Ou finos casaquinhos de meia-estação, pois o clima era perfeito naqueles dias.
A pele enrugada de papel crepon na parte interna dos cotovelos também não é minha. É a pele de minha avó e é agradável acariciá-la de novo enquanto a velhinha dedilha o rosário eterno de sua tristeza e observa os poucos transeuntes na praça ensolarada.
--“Lá vem Aída com o cachorro Lux.”
--“Alfredo vai à igreja com a mulher e a filha e o sino ainda nem chamou para a missa.”
--“Cuidado, menina, não embarace as meadas da lã, estes fios são muito delicados e há pequenas nuances de cor que só aparecem depois do trabalho pronto.”
--“Seu avô está chegando, manda Antoninha servir o café.”
Aída chegou, conversou um pouco e foi embora. Ela e o cachorro Lux.
Alfredo e a família ainda estão na igreja, compenetrados e solenes, enquanto a menina leviana embaraça irremediavelmente as lãs de todas as cores.
O avô? Sentou-se cansado no sofá de couro marron e fechou os olhos.
Está dormindo.